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http://underpop.online.fr 2009-01-19  

Morte

death
Nosso limite, nosso fim. De Heráclito - que afirmava que constantemente damos diferentes formas a nossas vidas, mas que a última forma nos é dada pelos vermes - a Heidegger - que nos apresenta como um "ser para a morte": nossa única certeza, nossa limitação e, paradoxalmente, nossa possibilidade de ser-no-mundo - a morte aparece em suas diferentes faces e leituras, como possibilidades de vida.

Se estamos vivos, caminhamos para a morte, morremos a cada instante, mas também cultivamos a vida, com substituições de nossas células, com renovações de nosso ser. O mesmo fruto, diz Heráclito, é sadio e podre, também não seríamos nós, ao mesmo tempo, sadios e podres? Nossas organizações sociais nascem e morrem a cada dia, refazem-se, desfazem-se em novas formas, em colisão de ideias. Não há pleno sem a contradição, a divergência já anunciada por Heráclito é verificada diariamente. Se repetimos o mesmo, não há fluxo, não há vida.

"Quando morremos? Na verdade, morremos todos os dias. Morte são também nossas decepções, nossos projetos falidos, nossas ideias abortadas. Morte é tudo o que nega a vida. A morte definitiva, a que encerra todos os atos, a que nos apresenta a vida concluída, dessa não podemos tratar porque ela nos excede. Restam-nos os insucessos que a anunciam, neles acenam os signos do que não nos é dado alcançar. Esperamos e conjeturamos. Como poderíamos, de outro modo, elevar-nos acima da solidez dos corpos que nos cercam, assinalando-lhes a precariedade?" (SCHÜLER, 2001: 196).

Quantas vezes morremos em vida? Quantos projetos abortados? Quantas decepções? Num primeiro momento a morte nos atinge, congela, impede. Mas assim que vivemos nosso luto, que choramos nossos sonhos mortos, nova vida surge: novos planos, novas possibilidades, às vezes melhores que as anteriores. Quantas vezes se faz necessário que abortemos um projeto falido para darmos lugar a uma proposta mais condizente com as possibilidades reais? Quantas outras vezes necessitamos negar uma ideia para que outras possam surgir? Quantas vezes aquele que nos contradiz e nos provoca ao abandono de um posicionamento fechado nos impulsiona, ao mesmo tempo, ao renascimento, através de novas posições?

O problema é que tememos a morte, nos apavoramos diante dela, ao invés de vê-la como possibilidade de vida. Queremos somente a vida, o que é, como afirma Schüler, utopia. Não há vida sem morte, nem morte sem vida. Poderíamos ficar com Epicuro que nos garante que não devemos temer a morte, porque enquanto estamos vivos ela não está presente, e quando ela está, nós é que não estamos.

"Então, o mais terrível de todos os males, a morte, não significa nada para nós, justamente porque, quando estamos vivos, é a morte que não está presente; ao contrário, quando a morte está presente, nós é que não estamos. A morte, portanto, não é nada, nem para os vivos, nem para os mortos, já que para aqueles ela não existe, ao passo que estes não estão mais aqui. E, no entanto, a maioria das pessoas ora foge da morte como se fosse o maior dos males, ora a deseja como descanso dos males da vida." (EPICURO, 2002: 29).

Apesar de inevitável, lutamos constantemente contra a limitação que nos é imposta. Buscamos todos os meios possíveis para preservar a vida. O desenvolvimento tecnológico, o investimento em medicamentos, as pesquisas sobre formas de ampliar os limites da vida são frequentes e buscados em larga escala na sociedade atual. Há quem aposte na construção dos ciborgues, considerando a mistura de silício com material genético como um ponto de partida para a imortalidade. Há quem defenda a possibilidade de um download de nossa consciência para uma máquina, permitindo assim a manutenção da vida em outro formato, em outro hardware, como, por exemplo, Kurzweil, em A era das máquinas espirituais.

Mas nos preocupamos com outras formas de morte? Claude Levi-Strauss, em Antropologia Estrutural, descreve algumas situações em sociedades primitivas, onde os condenados à morte simbólica - ou seja, aqueles que por algum motivo foram condenados por suas sociedades a serem tratados como se não existissem, como se tivessem morrido - em pouco tempo morriam de fato.

Quanta morte há, então, na indiferença? Afirma Buber, em Eu e Tu, que o contrário do amor não é o ódio, e sim a indiferença. A indiferença não provoca, exclui; não discorda, anula; impede a vida, mata. Diz Schüler: "Há espaço comum quando a diferença não provoca indiferença." (2001: 145). No espaço comum construímos, ampliamos as margens do rio que é e não é o mesmo. O espaço comum propicia a morte do mesmo para o surgimento do novo, do eu que se constitui junto-com-o-outro, daquele que sai do idiotismo e, em seu movimento, cria a vida.

Se buscamos a vida e tememos a morte, porque nos tornamos a cada dia mais ensimesmados? Por que constituímos uma sociedade cada vez mais individualista? Por que tratamos o outro com indiferença? Por que nos permitimos tratar com indiferença? Qual a diferença que fazemos no mundo onde vivemos? Se morte e vida são complementares, se morremos a cada dia e isso nos permite renovação, qual a nossa renovação diária?







Referências Bibliográficas:

BUBER, M. Eu e Tu. São Paulo: Centauro, 2008.
EPICURO. Carta sobre a felicidade - a Meneceu. São Paulo: UNESP, 2002.
HERÁCLITO. Col. Os Pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1973.
HEIDEGGER, Martin. Ser e Tempo. Petrópolis: Vozes, 1989.
KURZWEIL, Ray. Era das máquinas espirituais. São Paulo: Aleph, 2007.
LEVI-STRAUSS, Claude. Antropologia Estrutural. São Paulo: Cosac Naif: 2008.
SCHÜLER, Donaldo. Heráclito e seu (dis)curso. Porto Alegre: L&PM, 2001.



Morte e vida


"Vida só vida, vida sem sombra é visão utópica projetada para além do mundo de contradições, trabalho e guerra. Nessa utopia não haveria mudanças nem fluxo, nem trabalho. No extremo oposto teríamos o trabalho que não se renova, a impiedosa tarefa de Sísifo, vida sem lógica, sem Discurso. O Discurso revela-se no transcurso. Negados ambos os extremos, resta a vida-morte, vida que se refaz, transcorre." (Schüler)

"... não devemos temer a morte, porque enquanto estamos vivos ela não está presente, e quando ela está, nós é que não estamos"



Death

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um neurônio consegue gravar um minuto de memória

Apenas um neurônio na região frontal do cérebro é capaz, sozinho, de guardar memórias por um minuto e possivelmente mais, revela um estudo realizado por cientistas estadunidenses.

A pesquisa é a primeira a identificar o sinal que estabelece uma memória celular não permanente e a revelar como o cérebro guarda informações temporárias.

Segundo um dos responsáveis pelo estudo, o psiquiatra Don Cooper, o estudo ajuda a entender de que forma o cérebro guarda informações que se alteram constantemente.

Efe
Imagem mostra neurônios de rato coloridos com proteínas fluorescentes. Estudo feito no Texas ajuda a compreender como o cérebro guarda memórias temporárias.
Ele também disse que o estudo mostra paralelos entre a forma como o cérebro e os computadores guardam informações.

Memória permanente

O estudo foi feito no Southwestern Medical Center da University of Texas, em Dallas, e aparece na edição de fevereiro da publicação científica "Nature Neuroscience".

Usando eletrodos minúsculos, os pesquisadores mediram o processo de formação de memória no cérebro das cobaias.

Os cientistas já sabiam como memórias permanentes são arquivadas.

Este processo, no entanto, leva minutos ou até horas para ser ativado e desativado, e é muito lento para guardar temporariamente informações que chegam rapidamente.

No estudo, os pesquisadores identificaram um outro processo de memória celular, desencadeado por impulsos rápidos de informação que duram menos de um segundo, em células nervosas individuais.

Esse processo pode durar apenas um minuto.

Como um computador

Cooper cita como exemplo o tipo de memória que um crupiê usa quando conta cartas em um jogo de 21 - uma memória que, como bem sabem os donos de cassinos, é sensível aos efeitos do álcool e outras distrações, como o ruído.

(Esta memória) "é mais parecida com a memória RAM de um computador do que com a memória arquivada no disco rígido", disse Cooper.

"A memória no disco rígido é mais permanente e você pode acessá-la repetidamente. A memória RAM é um arquivo temporário que pode ser re-escrito e que permite que uma pessoa faça várias tarefas ao mesmo tempo", acrescentou.

O pesquisador acredita que a descoberta tem implicações importantes nos tratamentos para pessoas com vícios, distúrbios de atenção e perda de memória associada ao estresse.

"Se pudermos identificar e manipular os componentes moleculares da memória, poderemos desenvolver drogas que melhorem a capacidade de uma pessoa de manter essa memória temporária para que ela possa completar tarefas sem ser perturbada", disse Cooper.

"Para pessoas viciadas em drogas, podemos fortalecer essa parte do cérebro associada à tomada de decisões, permitindo que elas ignorem impulsos e avaliem as consequências negativas do seu comportamento antes de usar drogas."

O próximo passo das pesquisas, segundo os estudiosos, é identificar a estrutura responsável por reter e regenerar um traço de memória.
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