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Artigo 67, II
(JTJ Volume 181 Página 131)
COMPETÊNCIA Ação civil pública Óbice à contratação de menores para trabalho penoso Artigo 67, inciso II, do Estatuto da Criança e do Adolescente Relação de emprego não discutida Competência da Justiça Comum Estadual, através da Vara da Infância e da Juventude e não da Justiça do Trabalho Recurso provido.
Compete à Justiça da Infância e da Juventude conhecer e julgar ações civis públicas que visem garantir os direitos fundamentais da criança e do adolescente, enquanto que à Justiça do Trabalho incumbe assegurar os direitos decorrentes da relação de emprego. Agravo de Instrumento n. 31.072-0 Matão Agravante: Ministério Público Agravados: Agropecuária Boa Vista S.A. e outros.
ACÓRDÃO
Ementa oficial:
Agravo de Instrumento Competência da Vara da Infância e da Juventude para apreciar e julgar ação civil pública proposta pelo Ministério Público, visando à proibição de contratação de menores para trabalho considerado penoso Incompetência da Justiça do Trabalho, já que não cuida a questão das relações de emprego Provimento do recurso.
ACORDAM, em Câmara Especial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, por votação unânime, dar provimento ao recurso, de conformidade com o relatório e voto do Relator, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Participaram do julgamento os Senhores Desembargadores Dirceu de Mello (Presidente) e Nigro Conceição.
São Paulo, 23 de maio de 1996. PRADO DE TOLEDO, Relator. VOTO
Trata-se de agravo de instrumento interposto pelo Ministério Público do Estado de São Paulo nos autos da ação civil pública movida em face da Agropecuária Boa Vista S.A. e outras, inconformado com a respeitável decisão que entendeu ser a Justiça Comum Estadual absolutamente incompetente para conhecer e decidir a lide, determinando a remessa dos autos à Justiça do Trabalho.
Aduz, para tanto, que se equivocou o douto Magistrado ao confundir atribuição do Ministério Público com competência da Vara da Infância e da Juventude e da Justiça do Trabalho. Essa última se firma nos dissídios individuais e coletivos entre trabalhadores e empregados e versa sobre controvérsias decorrentes da relação de trabalho. O que se busca na ação é a garantia dos direitos fundamentais relacionados com os artigos 7º a 69 do Estatuto da Criança e do Adolescente e não ataca qualquer relação de trabalho, a qual será atingida, em conseqüência, pelo atendimento daqueles. E, tal repercussão não pode ser fator determinante da competência. A vedação de trabalho penoso a adolescente não tem o caráter constitucional, sendo essa previsão exclusiva do Estatuto da Criança e do Adolescente (artigo 67, inciso II, parte final). Não cuida o caso de defesa dos direitos e interesses dos menores decorrentes das relações de trabalho. Pede-se às ora agravadas obediência a direitos fundamentais das crianças. Não é porque a legislação trabalhista protege o trabalho do menor que a competência deva ser deslocada para a Justiça do Trabalho. Culminou por pleitear seja estabelecida a competência para o processo em questão como sendo da Vara da Infância e da Juventude da Comarca de Matão.
Foi apresentada contraminuta às fls. 123/127, oportunidade em que a agravada Agropecuária Boa-Vista S.A. se manifestou de molde a afastar os argumentos havidos em sede de agravo.
Da mesma forma se houveram a Água Rica S.A. Agropecuária, Monte Alto S.A. Agropecuária e a Empresa Agrícola Diamantina S.A. (fls. 149-150). Às fls. 148 o Meritíssimo Juiz de Direito manteve sua anterior decisão.
Com os autos encaminhados à Procuradoria-Geral de Justiça, seu representante opinou no sentido de dever ser, em síntese, provido o agravo, após tecer considerações preliminares.
É o relatório.
Inicialmente, de ser consignado que a competência para apreciação do presente recurso é desta Câmara Especial, uma vez que, em que pese cuidar de questão relativa à incompetência absoluta, como bem salientado pela nobre Procuradora de Justiça oficiante nos autos, trata-se de processo da jurisdição da Vara da Infância e da Juventude, cuja competência é exclusiva desta Câmara nos termos do artigo 188, inciso I, do Regimento Interno deste Tribunal de Justiça.
Quanto ao tema de fundo da questão em debate, é certo que o Ministério Público, por intermédio do Promotor de Justiça da Infância e da Juventude da Comarca de Matão, propôs a competente "ação civil pública" contra as ora agravadas, visando à garantia dos direitos fundamentais de adolescentes. Dizendo que esses desenvolvem trabalho penoso, proibido pelo artigo 67, inciso II, parte final, do Estatuto da Criança e do Adolescente, culminou por pleitear seja imposto às ora agravadas obrigação de não fazer, consistente na obrigação de não contratar para qualquer atividade agrícola relacionada com a cultura de cana-de-açúcar, na Comarca de Matão, menores de catorze anos, e não contratar para o corte da cana-de-açúcar menores de dezoito anos, sob pena de pagamento de multa.
Referido pedido teve como fundamento os artigos 7º, inciso XXXIII e 227, § 3º, inciso I, da Carta da República, bem como os artigos 60 a 69 do Estatuto da Criança e do Adolescente.
Frisou o ora agravante que a finalidade da referida ação é a proteção dos direitos fundamentais decorrentes do trabalho, tendose em conta a qualidade de adolescente das pessoas e ser penoso o trabalho.
De fato, como salientado nas razões recursais e pinçado pela nobre Procuradora de Justiça, "... a vedação de trabalho penoso a adolescente não tem caráter constitucional...", mas previsão exclusiva no Estatuto da Criança e do Adolescente, conforme o seu artigo 67, inciso II, parte final.
Bem se colocou às fls. 173:
"Compete à Justiça da Infância e da Juventude conhecer e julgar ações civis públicas que visem garantir os direitos fundamentais da criança e do adolescente, enquanto que à Justiça do Trabalho incumbe assegurar os direitos decorrentes da relação de emprego.
:
Inexiste conflito entre capital e trabalho, mas sim proteção dos referidos direitos, tutelados pelo Ministério Público, representando o Estado e a Sociedade, contra empresas que não respeitam tais direitos assegurados pelo Estatuto da Criança e do Adolescente."
Em suma, in casu, não há se falar de direitos sociais, constitucionalmente garantidos, decorrentes das relações de trabalho, fato esse que deslocaria a competência para a Justiça Obreira. Mas sim, em direitos fundamentais de menores previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente e na Carta Magna. Fundamentalmente na questão pertinente ao trabalho penoso.
Se for, em conseqüência, atingida a relação empregatícia, trata-se de resultado que não pode vir a fixar a competência do Juízo, eis que indevido o raciocínio.
E, assim sendo, não compete à Justiça do Trabalho a apreciação de casos que tais, da forma que fundamentado, mas sim às Varas especializadas e privativas da Infância e da Juventude. Dest'arte, pelo exposto, dou provimento ao agravo de instrumento interposto pelo Ministério Público de São Paulo, para o fim de fixar a competência da Vara da Infância e da Juventude de Matão para conhecer e julgar a demanda principal ajuizada.
Em relação à matéria:
Agravo de Instrumento n. 22.416-0 São Paulo Câmara Especial Julgamento: 16.11.95 Relator: Dirceu de Mello Votação unânime Publicado na "JTJ", ed. LEX, vol. 178/211.