Educação Física é Ginástica?

Para os gregos, era. Quando Platão, por intermédio de Sócrates, afirma que a Educação ideal compreendia a ginástica para o corpo e a música para a alma, usava conotações peculiares à época. Música significava "cultura espiritual", envolvendo a história, poesia, drama, ciência, oratória e a música propriamente dita. A ginástica - etimologicamente "a arte de desenvolver o corpo nu" - compreendia todos os exercícios físicos, englobando as corridas, saltos, lançamentos e lutas. Tal qual a concebemos, provavelmente a ginástica já era praticada, sendo também aí incluída. Nessa época, a ginástica denota uma preocupação de ordem médica, haja vista a definição que Platão lhe destinara: "A ginástica tem por objetivo regular a assimilação e a desassimilação e obter a simetria fisiológica da vida orgânica, da qual dependem a saúde, a força e outros bens físicos". Dois séculos depois de Platão, a ginástica não possuía mais aquele sentido grego tão abrangente, mas a abordagem médica ainda era preponderante.

Em De Arte Ginástica, o médico renascentista Mercuriale conceituou ginástica como "a capacidade de prever o efeito dos exercícios corporais e de conhecer a sua execução prática, a fim de obter e conservar a saúde e o bem- estar". A partir do século XIX foi-se firmando o conceito de ginástica como sendo atividade física que, artificial e intencionalmente, provocaria modificações anatômicas e fisiológicas no corpo humano. Era a ginástica racional e científica, considerada agora como elemento da Educação Física, expressão cunhada em fins do século XVIII.

Essa artificialidade começou a ser combatida quando, principalmente na Áustria e na Alemanha, surgiram métodos que preconizavam uma "ginástica natural", em oposição à antiga ginástica com efeitos localizados. A partir daí exacerbou-se o conflito artificial X natural, pois esta última passou a ser defendida pelos professores que queriam dar um cunho eminentemente pedagógico à ginástica. A ginástica artificial utiliza-se exclusivamente de exercícios analíticos, aqueles que, pela fixação deliberada de alguns segmentos do corpo, localizam o trabalho muscular e articular pretendido. O exercício natural, por sua vez, implica a movimentação do corpo entendido como uma totalidade.

Ora, a simples observação do cotidiano leva à conclusão de que os gestos e os movimentos no ser humano são globais. Quando alguém se abaixa para apanhar um objeto que caiu ao solo, não o faz com as pernas esticadas e com as costas retas. O corpo trabalha como um todo, de forma total e natural. Um grupo de crianças brincando na hora do recreio ou num parque desvenda a espontaneidade com que se movimentam: elas correm, saltam, saltitam, lançam, lutam e rolam. São as manifestações de expressão espontânea do ser humano. Realizam atividades que não dependem, isoladamente, de determinadas regiões do corpo. Desenvolvem suas brincadeiras de forma natural e global, não dependendo de modelos preconcebidos ou de cópias irrefletidas.

A ginástica - natural ou artificial - deve ser analisada à luz dos seus objetivos. Os exercícios analíticos têm aplicação para os fins corretivos a que originariamente se destinavam. Mesmo assim, exigirá do professor de Educação Física um conhecimento profundo de disciplinas da área médica, além da necessidade de especialização em fisioterapia. Essa, porém, é a modalidade que mais tem aplicação nas academias de ginástica e, até mesmo, nas escolas - aqui, totalmente condenada. O que é evidente, sem dúvida, é a visceral ligação da ginástica com a Medicina, chegando mesmo, em alguns momentos, a se confundirem.

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