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Estatuto da Criança e do Adolescente LEI Nº 8.069, DE 13 DE JULHO DE 1990

(DOU 16.07.90)

Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente, e dá outras providências.

O Presidente da República:

Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte lei:

LIVRO I

PARTE GERAL TÍTULO I

DAS DISPOSIÇÕES PRELIMINARES

Artigo 1º Esta Lei dispõe sobre a proteção integral à criança e ao adolescente.

Artigo 2º Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade.

Parágrafo único. Nos casos expressos em lei,


aplica-se excepcionalmente este Estatuto às pessoas entre dezoito e vinte e um anos de idade.


Artigo 1° e 2°

(JTJ Volume 179 Página 100)


MENOR Guarda Criança indígena Competência da Justiça Comum Estadual e não da Justiça Federal Interpretação dos artigos 109, inciso XI, da Constituição da República, e 1º e 2º da Lei Federal n. 8.069, de 1990 Irrelevância, ademais, da intervenção da FUNAI Recurso não provido.


MENOR Guarda Criança indígena Deferimento, tendo em vista o estado de saúde do infante e das péssimas condições de sua comunidade Prevalência, ademais, da conservação da vida sobre a preservação dos costumes indígenas Recurso não provido.


Apelação Cível n. 28.250-0. ACÓRDÃO

Ementas oficiais:


Menor Pedido de guarda envolvendo criança indígena Competência da Justiça Comum Estadual Inteligência do disposto no inciso XI do artigo 109 da Constituição da República Intervenção da FUNAI no feito, que não se constitui em causa de deslocamento da competência originária.


Menor Pedido de guarda Condições pessoais da criança, aliadas à situação de sua comunidade de origem que recomendavam, mesmo, o deferimento da guarda postulada Recursos improvidos.


ACORDAM, em Câmara Especial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, por votação unânime, rejeitada a matéria preliminar, negar provimento aos recursos, de conformidade com o relatório e voto do Relator, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


Participaram do julgamento os Senhores Desembargadores Yussef Cahali (Presidente) e Ney Almada.


São Paulo, 30 de novembro de 1995. DIRCEU DE MELLO, Relator. VOTO

Perante o douto Juízo de Direito de Ubatuba, os apelados deduziram pedido de guarda da criança A. S., integrante de comunidade indígena. Ao cabo do procedimento, a douta Magistrada determinou a permanência da criança sob a responsabilidade dos recorridos, até que sua aldeia possa lhe oferecer condições mínimas de sobrevivência.


Apelam, a Comunidade Indígena Guarani e a Fundação Nacional do Índio (FUNAI), sustentando, ambas, a incompetência absoluta da Justiça Comum Estadual, por tratar-se de matéria afeta à Justiça Federal. No mérito, pleiteiam o imediato retorno do infante ao seu habitat. Processado o apelo e mantida, implicitamente, a respeitável decisão impugnada, subiram os autos.


A ilustrada Procuradoria-Geral de Justiça pediu o desacolhimento da preliminar e, no mérito, inclinou-se pelo provimento parcial do apelo.


Manifestou-se, espontaneamente, o Ministério Público Federal, que foi admitido no feito, pelo respeitável despacho de fls. 304.


Esse o relatório.


1. O caso versa peculiaridade.


Cuida-se de pedido de guarda envolvendo integrante de comunidade indígena. Bem por isso, os apelantes e o Ministério Público Federal defendem a incompetência da Justiça Comum Estadual para o exame da questão, que seria da alçada da Justiça Federal, por força do que dispõe, especialmente, o inciso XI do artigo 109 da Constituição da República.


Sem razão, contudo.


O texto constitucional, quando se refere à disputa sobre direitos indígenas (artigo 109, inciso XI) e à legitimação para agir (artigo 232), quer significar os litígios de interesse de toda a comunidade aborígine e voltados, pelos menos preponderantemente, para a questão do uso e ocupação da terra. É o que se extrai da doutrina a respeito (cf. JOSÉ AFONSO DA SILVA, "Curso de Direito Constitucional Positivo", Editora Revista dos Tribunais, 7ª ed., 1991, págs. 714/722; PINTO FERREIRA, "Comentários à Constituição Brasileira", vol. 7º/452, Editora Saraiva, 1995; J. CRETELLA JR., "Comentários à Constituição Brasileira de 1988", vol. VIII/4.552-4.570, Editora Forense Universitária, 1993 e SOLANGE RITA MARCZYNSKI, "Índios Temas Polêmicos", "Revista de Direito Civil", "RT", vol. 54/69-70).


Por outro lado, a Lei Federal n. 8.069, de 1990, é clara ao estabelecer, no seu artigo 146, que "a autoridade a que se refere esta lei é o Juiz da Infância e da Juventude, ou o Juiz que exerce essa função, na forma da Lei de Organização Judiciária local".


Esse dispositivo não afronta a Constituição, porque não há, no texto maior, qualquer disposição em sentido contrário.


Dessarte, guarda, tutela, adoção, apuração de ato infracional e outras matérias, são de competência exclusiva do Juiz da Infância e da Juventude, que integra a Magistratura Comum Estadual, independentemente da etnia da criança ou do adolescente.


A propósito, os artigos 1º e 2º da lei de regência não fazem qualquer distinção entre o índio e o não-índio. A lei estende sua proteção integral a toda criança e adolescente. Qualquer distinção nesse campo representaria, por certo, odiosa discriminação. Afinal, por princípio, sob o ponto de vista jurídico-formal, todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza (Constituição da República, artigo 5º, caput).


Não há que se falar, também, em deslocamento da competência porque a União, por intermédio da FUNAI, passou a intervir no feito, na qualidade de parte. A União ou a FUNAI não assumiu o pólo passivo da relação processual, pela simples razão de que não há processo, senão apenas procedimento, verificatório, a teor do que dispõe o artigo 153 da Lei Federal n. 8.069, de 1990, que visa à aplicação como se fez de uma das medidas de proteção de que trata o artigo 101 daquele texto.


A competência é, pois, da Justiça Comum Estadual.


2. O procedimento verificatório teve início em março de 1993, porque o pequeno A., então com três anos de idade, encontrava-se internado na Santa Casa de Misericórdia de ..., havia dois meses, com quadro de tuberculose pulmonar, desnutrição grave e apresentando risco iminente de vida. O próprio médico da irmandade recomendou abrigamento do infante, dadas as diversas recidivas de tuberculose pulmonar (cf. fls. 3 do apenso).


Ante esse quadro de inegável e profunda gravidade, os recorridos postularam e obtiveram, em maio daquele ano, a guarda da criança.


O detalhado relatório de fls. 72, confirmado no depoimento de fls. 171-172, é verdadeiramente impressionante. Demonstra que A. era vítima de negligência severa. Suas sucessivas internações evidenciavam falta de atenção primária à saúde: alimentação, higiene, aplicações de medicamentos, etc. O retorno do paciente às precárias condições de assistência certamente o levariam ao óbito. O relato e o testemunho são confirmados pelo relatório de fls. 215, onde dois médicos afirmam que em março de 1992, em uma cobertura de foco na Aldeia ..., A. foi encontrado em péssimas condições higiênicas, nutricionais e respiratórias, e compartilhava um biscoito de farinha de mandioca, no chão, com um cachorro com sarna.


Em função dos cuidados que recebeu dos guardiães, A. recuperou-se da tuberculose, embora contine exigindo cuidados médicos, por ser portador de bronquite alérgica. Integrou-se ao lar substituto, sem contudo perder de vista suas raízes sócio-culturais, dados os contatos que os guardiães lhe possibilitam com seus pares. Mas A. é enfático ao afirmar que não deseja retornar para a aldeia (cf. fls. 161/163 e 171-172), que não gostaria de voltar a viver na aldeia (cf. fls. 224).


Apurou-se, de outro lado, que a genitora do infante (seu genitor está em local ignorado), e seus pares vivem em condições subumanas, com gatos e cachorros dividindo o mesmo espaço com os moradores do local, que sobrevivem do artesanato. Observou o estudo social realizado que na casa da genitora do infante, o único alimento disponível eram os pães enviados pelos guardiães (cf. fls. 186/189).


Esse estado de coisas, bem se vê, choca-se de frente com a afirmação da FUNAI, às fls. 212, no sentido de que a Fundação Nacional da Saúde presta àquela comunidade indígena todo tipo de assistência, não deixando faltar medicamentos ou qualquer outro tipo de ajuda aos silvícolas do Estado de São Paulo e Rio de Janeiro... (sem destaques no original).


Não se trata, apenas, de diferenças de costumes, como pretende a FUNAI. A comunidade de origem do pequeno A., se não vive como branco, também não vive como índio. O verdadeiro clã aborígine sempre foi auto-suficiente: plantava, pescava e caçava para o seu sustento. A situação da aldeia de A. é bem outra. Nada tem a ver com os costumes, hábitos e habitat do povo indígena.


Daí a razão do desacolhimento dos apelos: a comunidade de origem de A., dada sua particular situação de saúde, não tem condições de lhe emprestar os cuidados mínimos, básicos, elementares, para lhe assegurar, antes de mais nada, o direito à vida, que lhe é garantido pelo caput do artigo 5º da Constituição da República.


Como bem colocado pela Doutora Juíza de Direito, não restam dúvidas que é preferível sacrificar a preservação dos costumes indígenas para a conservação da vida do índio, que antes de tudo é um ser humano.


A proposta da douta Procuradoria-Geral de Justiça não atenderia aos superiores interesses da criança, que precisa ser mantida a resguardo de recaída em seu estado de saúde.


Bem agiu, portanto, a douta Magistrada, ao manter o infante com seus guardiães, até que sua comunidade reúna condições de novamente recebê-lo. E enquanto essas condições não se verificarem, A. continuará a manter contado com os seus, assim se preservando, na medida do possível, suas nobres raízes.


3. Diante do exposto, superada a preliminar de incompetência da Justiça Comum Estadual,

nega-se provimento aos apelos.


Artigo 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.

Artigo 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do Poder Público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.

Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:

a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias;

b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública;

c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas;

d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude.


Artigo 4°

(JSTJ e TRF Volume 86 Página 149)


RECURSO ESPECIAL N. 63.128-9 GO (95.0015132-4)


Sexta Turma (DJ, 20.05.1996)


Relator: Exmo. Sr. Ministro Adhemar Maciel Recorrente: Ministério Público do Estado de Goiás Recorrido: Estado de Goiás Advogados: Drs. Maria José Perillo Fleury e outros e Getúlio Vargas de Castro e outros


EMENTA: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. CONSTITUIÇÃO DIRIGENTE E PROGRAMÁTICA. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. AÇÃO CIVIL PÚBLICA PARA OBRIGAR O GOVERNO GOIANO A CONSTRUIR UM CENTRO DE RECUPERAÇÃO E TRIAGEM. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA. RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO.


I O Ministério Público do Estado de Goiás, com base nas Constituições Federal e Estadual e no artigo 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente ajuizou ação civil pública para compelir o Governo Estadual a construir um Centro de Recuperação e Triagem, em face de prioridade genericamente estabelecida. O TJGO, em apelação, decretou a carência da ação por impossibilidade jurídica.


II A Constituição Federal e em suas águas a Constituição do Estado de Goiás são "dirigentes" e "programáticas". Têm, no particular, preceitos impositivos para o Legislativo (elaborar leis infraconstitucionais de acordo com as "tarefas" e "programas" preestabelecidos) e para o Judiciário ("atualização constitucional"). Mas, no caso dos autos as normas invocadas não estabelecem, de modo concreto, a obrigação do Executivo de construir no momento, o Centro. Assim, haveria uma intromissão indébita do Poder Judiciário no Executivo, único em condições de escolher o momento oportuno e conveniente para a execução da obra reclamada.


III Recurso especial não conhecido. Decisão recorrida mantida.


ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas:


Decide a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade negar provimento ao recurso nos termos do voto do Sr. Ministro Relator na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Votaram de acordo os Srs. Ministros William Patterson, Luiz Vicente Cernicchiaro, Anselmo Santiago e Vicente Leal.


Custas, como de lei.


Brasília, 11 de março de 1996 (data do julgamento). Ministro ADHEMAR MACIEL, Presidente e Relator. RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO ADHEMAR MACIEL: Tratase de recurso especial interposto pelo Ministério Público do Estado de Goiás, com arrimo no artigo 105, III, a e b, da Constituição Federal contra acórdão proferido pela Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás.


O recorrente, por intermédio do Núcleo da Infância e da Juventude, propôs ação civil pública para compelir o Estado de Goiás a determinar a construção de estabelecimento educacional para o acolhimento de adolescentes que venham a receber a aplicação de medida sócio-educativa de internamento. Julgada procedente em parte, foi a decisão cassada em grau de apelação, cujo acórdão registrou a carência de ação, por falta de possibilidade jurídica do pedido. 3. Alega o recorrente que a decisão guerreada contrariou o artigo 4º da Lei n. 8.069/90 Estatuto da Criança e do Adolescente -

, e convalidou ato omissivo do governo local contestado tanto em face da referida lei quanto em face da Constituição Estadual. 4. O recurso foi admitido com fundamento na alínea b do permissivo constitucional.


5. O Ministério Público Federal, em parecer do Dr. WÁGNER DE CASTRO MATHIAS NETTO, opinou pelo provimento do recurso. Não cabe alegação de falta de recurso orçamentário. Além disso, determinação judicial objetivando adequar prioridade que deveria ser concedida pelo Estado ao menor é juridicamente possível. Não há interferência no poder discricionário estatal, devendo este ser entendido como o poder outorgado ao agente público para atuar dentro do âmbito demarcado pela regra jurídica.


É o relatório. VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO ADHEMAR MACIEL

(Relator): O especial se faz pelas alíneas a e b do permissivo constitucional. O recorrente transcreve o artigo 171 da Constituição do Estado de Goiás:


"O Estado e os Municípios assegurarão à criança e adolescente, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos à vida, à saúde, à moradia, ao lazer, à proteção no trabalho, à cultura, à convivência familiar e comunitária, nos termos da Constituição da República, compreendendo: I :


:


IV aquinhoamento privilegiado de recursos públicos, para os programas de atendimento de direitos e proteção especial da criança e do adolescente".


O artigo "supra", não é preciso muito esforço ou acuidade para perceber, se modelou bem de perto no artigo 227 da Constituição Federal ("Da Família, da Criança, do Adolescente e do Ido- so").


O artigo 4º da Lei n. 8.069/90, também transcrito pelo recorrente, dispõe:


"É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do Poder Público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.


Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende: a) :

:


c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas;


d) distinção privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude". Infelizmente, o recurso não tem como ser provido. Todavia, não posso furtar-me à transcrição de uma nota de admiração pela recorrente, a Promotora de Justiça MARIA JOSÉ PERILLO FLEURY, por seu idealismo, e porque não dizer, "posicionamento vanguardeiro em relação ao nosso atual estágio político-jurídico". Explico-me:


A nossa Constituição de 1988, mais do que todas as Cartas e Constituições brasileiras anteriores, é "dirigente" ("dirigierende Verfassung") e "programática" ("programmatische Verfassung"). Ela almeja "construir uma sociedade livre, justa e solidária" (art. 3º, I), erradicando "a pobreza e a marginalidade e reduzir as desigualdades sociais e regionais" ("id.", III). Em outras palavras, um dos objetivos fundamentais da nossa República Federativa é oferecer "diretivas modeladoras" para a própria Sociedade, acenando com a intervenção do Poder Público na "ordem econômica", "financeira", "cultural" e "ambiental". Essas normas programáticas se destinam especialmente aos Poderes Públicos. Ao Legislativo, para que ele procure elaborar as normas infraconstitucionais consoante os "programas" e "tarefas" gizados pela Constituição. Ao Judiciário, para que ele igualmente exerça a denominada "atualização constitucional" ("Verfassungsaktualisierung"), ou seja, interprete as leis tal qual preceituado na Constituição. Acontece que no caso dos autos as normas maiores não estabeleceram, de modo concreto, a escalada de prioridade. Assim, não se tem como obrigar o Executivo a construir o Centro de Recuperação e Triagem para a recepção de adolescentes submetidos ao regime compulsório de internamento. Haveria uma verdadeira intrusão do Judiciário no Executivo. O Relator "a quo", o eminente Desembargador NOÉ GONÇALVES FERREIRA, bem apreendeu em seu voto:


"Analisando o caso sob enfoque nestes autos em face do estudo ora reproduzido, tem-se, sem dúvida, que a sentença vergastada impôs ao Poder Executivo Estadual obrigação de executar obra inserida na sua discricionariedade, o que evidentemente, não é possível.


Sim, porque o Executivo, constitucionalmente autônomo, goza de total liberdade para eleger as obras prioritárias a serem construídas".


Ainda que escrito há mais de meio século e na França, onde o figurino constitucional é diferente do brasileiro, vale a pena transcrever palavras de Maurice Hauriou em seu "Précis Élémentaire de Droit Administratif" (Librairie du Recueill Sirey, 1938, p. 229):


"A administração não é animada, naquilo que ela faz, por uma vontade interior, mas, sim, por vontade executiva livre submetida à lei como um poder exterior. Segue-se que, de um lado, nas matérias de sua competência, enquanto seu poder não está ligado por disposições legais, ele é inteiramente autônomo e, por outro lado, nas matérias em que seu poder parece ligado pela lei, ele se conforma sempre a uma certa escolha de meios que lhe permite de se conformar voluntariamente à lei.


Esta faculdade de se conformar voluntariamente à lei é tanto mais reservada à administração das leis quanto ela goza constitucionalmente de uma certa liberdade na escolha dos momentos e das circunstâncias em que assegura esta aplicação.


Conforme este ponto de vista, convém mostrar novamente que o poder discricionário da administração consiste na faculdade de apreciar a "oportunidade" que pode ter de tomar ou não tomar uma decisão executória, ou de não torná-la imediatamente, que seja prescrita pela lei".


Ou no original:


"L'administration n'est pas animée, dans ce qu'elle fait, d'une volonté intérieure légale; elle est animée d'une volunté exécutive libre assujettie à la loi comme à un pouvoir extérieur. Il suit de là, d'une part, que, dans les matières de sa compétence, lorque son pouvoir n'est pas lié par des dispositions légales, il est entierement autonome, et, d'autre parte, que, dans les matières où son pouvoir paraît lié par la loi, il lui se conforme toujours à un certain choix des moyens qui lui permet de se conformer volontairement à la loi.


Cette faculté de se conformer volontairement à la loi est d'autant plus réservée à l'administration des lois et qu'elle jouit constitutionnellement d'une certaine latitude dans le choix des moments et des circonstances où elle assure cette application.


A ce point de vue, il convient d'indiquer à nouveau que le pouvoir discrétionnaire de l'administration consiste en la faculté d'apprécier l'opportunité qu'il peut y avoir à prendre ou à ne pas prendre une décision exécutoire, ou à ne pas la prendre immediatement, même lorsqu'elle est prescrite par la loi".


Com essas ligeiras considerações, conheço do recurso para negar-lhe provimento.


É como voto.


EXTRATO DA MINUTA


REsp n. 63.128-9 GO (95.0015132-4) Relator: Exmo. Sr. Ministro Adhemar Maciel. Recorrente: Ministério Público do Estado de Goiás. Recorrido: Estado de Goiás. Advogados: Drs. Maria José Perillo Fleury e outros e Getúlio Vargas de Castro e outros.


Decisão: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto do Exmo. Sr. Ministro Relator (em 11.03.96 6ª Turma).


Votaram os Exmos. Srs. Ministros William Patterson, Luiz Vicente Cernicchiaro, Anselmo Santiago e Vicente Leal. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro ADHEMAR MACIEL.


Artigo 5º Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais.

Artigo 6º Na interpretação desta Lei levar-seão em conta os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento.


Artigo 6°

ADOÇÃO PLENA Menor entregue à família substituta desde maio de 1.983, aos onze meses de idade (nascida em 16.06.82). Menor, hoje, com treze (13) anos de idade. Mãe meretriz, à época, e mãe de outras duas filhas de pais diferentes. Atualmente em lugar desconhecido, provavelmente em Curitiba, após o abandono do lar de seu último companheiro. Família substituta constituída, com três filhos, lavradores em chácara própria, que ofereceu à menor convívio inquebrantável. Processo de adoção que obedeceu o princípio do contraditório, com várias sindicâncias, onde demonstrou-se o abandono da filha, pela mãe, ensejando a perda do pátrio poder (art. 395, II do Código Civil). O interesse do menor deve prevalecer sobre qualquer outro interesse, quando seu destino estiver em discussão (art. 5º da Lei nº 6.697, de 10.10.79 Código de Menores). O Pátrio Poder não é mais considerado um direito absoluto e discricionário da mãe, mas instituto dirigido aos fins sociais e às exigências do bem comum. Se a menor há doze anos entregue voluntariamente à família substituta, mantém-se em lar amoroso e carinhoso, e inexistindo motivo sério que recomende seja modificada a situação, não há como reconhecer o direito da mãe biológica em reaver a filha, máxime comprovando ser, a mãe, mulher de residência inconstante, sem profissão definida, e proceder duvidoso (art. 6º, da Lei nº 8.069, de 13.07.90 Estatuto da Criança e do Adolescente). Provando-se que a mãe-biológica abandonou a menor, sem possibilidade de criá-la, aplica-se a perda do pátrio poder, devendo ser concedida a adoção plena à família substituta que lhe deu carinho, desvelo e amor (art. 45, § 1º, da Lei nº 8.069/90). (TJPR RA 32.589-3 Ac. 11.519 2ª C. Civ. -

Rel. Des. Negi Calixto J. 16.08.95)


Artigo 6°

ADOÇÃO SIMPLES CONCRETIZADA EM 1981 REVOGABILIDADE SUPERVENIÊNCIA DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE -